Xenoestrogênios – Nosso Futuro Roubado
Autora: Dr.ª Paula Taciana Figueiredo
Uma das ameaças mais graves à humanidade neste início do século 21 é a degradação ambiental decorrente das tecnologias que sustentam as lógicas da produção global. Elementos tóxicos potenciais causadores de doenças – desde alergias até mutações genéticas e cânceres – estão no ar, na água, nos alimentos, nas roupas, nos aviões, nos carros e em lugares insuspeitos de nossas casas, como o chuveiro elétrico.
A revolução industrial foi o marco da emissão massiva de toxinas, a partir da queima de carvão e óleo. Mas hoje já há inúmeros outros agentes, mais perigosos, produzidos em escala mundial, progressivamente desde 1930.
Os Xenoestrogênios, também conhecidos como disruptores endócrinos, fazem parte de um grupo de várias centenas de substâncias químicas – tais como o policloreto befenilas (PCBs), ftalatos e as dioxinas – utilizados em tudo, dos agrotóxicos aos retardadores de chamas, dos cosméticos aos fármacos, equipamentos, aparelhos e embalagens feitas com plástico, isopor e alumínio, produtos de limpeza para casa e aromatizantes de ambientes. Alguns deles alteram as funções de alguns hormônios em animais e no homem, inclusive bloqueando sua ação normal ou interferindo em como eles são produzidos nos organismos. E vão desde os hormônios que regulam atividades como o crescimento e o desenvolvimento até o comportamento, sendo seu potencial de danos bem claro.
“Muitos destes químicos podem afetar o desenvolvimento desde o útero”, diz Andreas Kortenkamp, um toxicologista da London University’s School of Pharmacy. “O problema é que estes efeitos não são detectados nas análises de rotina”, afirma. Isso ocorre porque os níveis considerados seguros, segundo as agências governamentais que regulam o uso dessas substâncias, são mais elevados que o nível necessário para causar as alterações bioquímicas progressivas que levarão finalmente a lesões irreversíveis no organismo, como malformações fetais. Além do efeito cumulativo individual, essas substâncias têm sinergismo entre si, onde o acúmulo de umas eleva o potencial lesivo de outras.
A conexão entre estas substâncias e os efeitos deletérios na vida selvagem já está bem definida: ursos polares pseudo-hermafroditas com micro-pênis, panteras com testículos atrofiados e trutas machos com ovas crescendo em seus testículos, além de jacarés-macho com características de fêmeas. Todos os fatos bem documentados como resultado dos disruptores endócrinos presentes no ambiente. As alterações que estão ocorrendo na natureza são uma vitrine dos nossos hábitos comportamentais e de consumo; a vida selvagem tem trazido, há muito tempo, alertas sobre os efeitos gerados pelos disruptores endócrinos, já que existem inúmeros trabalhos apontando para os efeitos deletérios dos Xenoestrogênios desde 1950.
Cientistas têm suspeitado, há longo tempo, que a presença destes químicos é também responsável pela alta prevalência de problemas de fertilidade em homens e pelo aumento na incidência de cânceres de tireóide, de mama e testicular.
Em 2005, cientistas na América do Norte (Swan et al.) confirmaram este temor de que uma classe de químicos conhecidos como ftalatos – utilizados para deixar os plásticos mais maleáveis – causam danos ao desenvolvimento de meninos ainda no útero materno. Pesquisadores já sabem há tempos que altas doses desta substância são danosas, mas este último trabalho sugere que mesmo em níveis normais – aqueles comumente encontrados em brinquedos, sacolas plásticas e filmes plásticos para alimentos – podem causar rupturas no desenvolvimento de órgãos reprodutivos dos machos.
Indícios adicionais para uma feminização silenciosa foram detectados pelo médico dinamarquês Niels Skakkebaek, da Universidade de Copenhagen, que publicou estes dados, para discussão, na revista médica “The Lancet”. Desde 1940 o número de espermatozóides por mililitro cúbico de sêmen dos homens, reduziu-se à metade. Concomitantemente, avolumaram-se os casos de cânceres testiculares e as deformidades dos órgãos genitais.
Estes fenômenos, segundo Skakkebaek, têm o mesmo motivo: os homens e os animais machos estão expostos a níveis nunca antes existentes de substâncias que se assemelham a hormônios sexuais femininos. “A sexualidade masculina se afoga num mar de estrogênios artificiais”, diz Skakkebaek.
A habilidade destas substâncias sintéticas de imitar o comportamento dos estrogênios surpreendeu até os profissionais mais experientes. Normalmente os hormônios naturais têm suas funções bem específicas, induzem reações bioquímicas ao se encaixarem com precisão nos receptores protéicos presentes nas células. Mas os Xenoestrógenos, moléculas químicas artificiais, portam-se como embusteiros já que imitam a ação dos esteróides sexuais. Conseguem enganar processos orgânicos vitais fazendo com que o corpo acredite que são estrogênios endógenos naturais. Embora os estrogênios artificiais em sua estrutura química sejam, muitas vezes, bastante diferentes dos estrógenos naturais, conseguem se conectar aos receptores correspondentes e sinalizarem reações “feminizantes” para o corpo. Deslocando os hormônios verdadeiros para fora de sua rota natural, tornam-se ativos e aptos. Substituindo os hormônios naturais, estes impostores são capazes de enviar sinais errados para o receptor químico que transporta o hormônio natural, tomando seu lugar na rota metabólica em que trabalha. Em estudos conduzidos em laboratório, por exemplo, ratos machos tratados com dioxina comportaram-se como fêmeas em cio.
Vimos que a contaminação ambiental e, consequentemente, a dos nossos organismos, já atingiu níveis críticos. Para piorar a situação, ainda não existem políticas claras, de saúde ou ambientais, eficazes no combate e/ou redução da poluição ambiental com Xenoestrogênios. Então, o que podemos fazer para nos proteger dessa onda avassaladora que ameaça a própria sobrevivência da nossa e de outras espécies?
O uso de alguns suplementos pode auxiliar, desde que você não tenha alguma contra-indicação à sua utilização. O Indol-3-carbinol é um antiestrogênio que pode ser encontrado em verduras da família botânica das brássicas como o brócolis, a couve-flor e a couve-de-bruxelas. Ele altera a rota na qual o estrogênio é metabolizado no organismo, acelerando a eliminação de xenoestrogênios do nosso corpo. O consumo de altas quantidades de fibras pode baixar as concentrações estrogênicas no sangue, particularmente em mulheres na fase pré-menopausa. Outras substâncias naturais, como carnitina, arginina, zinco, selênio, vitamina B-12, os antioxidantes – glutatione e as vitaminas C e E – além da coenzima Q10, têm se mostrado reativadores tanto da contagem e mobilidade dos espermatozóides como da fertilidade masculina. Para saber se você precisa, ou pode, tomar esses suplementos, fale com seu médico e peça que ele solicite os exames necessários ou pertinentes ao seu caso.
Trocar utensílios e embalagens plásticas, de isopor e alumínio por vidro e inox também ajuda a reduzir a contaminação de alimentos e líquidos pelos xenoestrógenos acima citados. É indicado também substituir o detergente de pia por sabão de coco, assim como os filmes plásticos e papel alumínio por papel manteiga.
O item mais difícil de corrigir é o do uso de cosméticos. A quase totalidade deles contém, na sua formulação, derivados de petróleo que são fontes de Xenoestrógenos. Sabonetes e shampoos infantis podem ajudar, mas é contraproducente solicitar que as pessoas deixem de usar seus cosméticos, hidratantes, protetores solares, maquiagem, pasta dental, perfumes, desodorantes, etc.
Concluindo, esta contaminação de estrogênios ambientais é global. Está praticamente impossível escaparmos de um confronto com estas moléculas químicas. Entretanto, algumas mudanças de hábitos alimentares, substituições de utensílios domésticos e objetos de uso diário, e uso regular de antioxidantes, sejam o I3C como outros nutrientes, podem desempenhar um importante papel, protegendo-nos, ao menos parcialmente, dos efeitos perigosos gerados por tais ecoestrogênios. Então, vamos juntos pôr mãos à obra na busca de uma vida mais saudável para nós, nossos filhos e as gerações que ainda virão. Ainda há tempo de reaver nosso futuro roubado.
Fonte: http://drapaulafigueiredo.blogspot.com.br/2011/09/xenoestrogenios-nosso-futuro-roubado.html